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Conta-me histórias é um blog onde vos mostro alguns dos meus trabalhos e onde podemos falar de tudo um pouco. Apresenta certos assuntos que acho relevantes e interessantes, sempre aberta a conselhos da vossa parte no sentido de o melhorar. Obrigado pela vossa visita. Fico à espera de muitas mais.

quinta-feira, 4 de julho de 2013

O mistério de Dona Bianca

Cada vez acredito mais que todos possuímos um contador de histórias dentro de nós. Uns contam a história simplesmente, outros guardam-na para si mesmo, outros ainda traduzem isso em arte. Deve ser por isso que existem cada vez mais pessoas a escrever e publicar livros. A necessidade de comunicação a isso obriga e é sempre importante ouvir ou ler uma história de outro alguém, pois podemos rever-mo-nos e aprender mais um pouco. Por isso, hoje trago um cheirinho de um livro que está no forno a ser cuidadosamente cozinhado. Directamente do Brasil, e em exclusivo no "Conta-me histórias", apresento um trecho do próximo livro do meu amigo Ricardo Silva e Sousa.  Espero que gostem e que vos aguce a curiosidade. Boas leituras!

Lua Branca
De Ricardo Silva e Sousa

Era uma vez, numa cidadezinha na serra, uma mulher que vivia sozinha e estava sempre no mundo da lua. Ninguém sabia de onde ela tinha vindo. Apareceu na casa do finado Seu Leônidas, muito tempo depois dele ter ido desta para melhor. 
Seu Leônidas era um homem misterioso, que não falava com ninguém. Nasceu e cresceu junto com a cidade, mas ninguém sabia da vida dele. Não tinha família, não tinha emprego, não tinha ninguém. A casa em que vivia foi construída por ele e levou anos para ficar pronta. Depois que morreu, do quê ninguém sabe, a casa ficou abandonada durante muitos anos. Até que a mulher apareceu. Diziam que era filha de Seu Leônidas. Outros diziam que era sobrinha. Outros, mais fofoqueiros, diziam que era sua amante, que vivia em outro lugar. 
Dona Bianca, este era o nome dela, passava os dias na varanda da casa, bordando um pano comprido, sem parar. Ia até a venda da cidade para comprar linha e alimentos. Outra vezes, podia-se ver Dona Bianca cuidando das plantinhas que ficavam na frente da casa. 
Quando Dona Bianca andava pela rua, os mais velhos ainda tentavam um “bom dia, boa tarde, boa noite” mas Dona Bianca não falava com ninguém. Só com seu Elias, dono da venda, que, depois de algum tempo, já deixava separada a compra de Dona Bianca para evitar falar com ela. 
Pele muito branca, olhos de cor cinza claro, vestindo sempre o mesmo vestido de chita comprido até os pés, sandálias de couro cru, Dona Bianca tinha um mistério. Quando a lua estava na fase nova, Dona Bianca ficava magrinha, mas tão magrinha que seus braços até pareciam feitos de arame. Conforme a lua ia crescendo, Dona Bianca ia engordando, até ficar redondinha, bem gordinha, quando a lua estava cheia. E assim vivia Dona Bianca. Minguando, minguando, crescendo, crescendo juntinho com a lua. 
Um dia veio a notícia: _Vai haver um eclipse total da lua, como nunca tinha sido visto naquela cidadezinha! 
Veio gente de toda parte. Cientistas, jornalistas, artistas, repentistas, sionistas, kardecistas, clérigos, esotéricos, macumbeiros, feiticeiros, políticos, holísticos, tarólogos, ufólogos, todos para ver, contar e cantar o eclipse lunar. Naquela noite, no auge da lua cheia, Dona Bianca, gordinha como a lua, foi até a praça onde todos estavam esperando o eclipse lunar. Dona Bianca desta vez estava muito grande. Seus braços nem encostavam no corpo de tão gordinhos. Nas suas mãos quase não se viam seus dedinhos. Dona Bianca estava assustada. Seus olhos fitavam a lua sem piscar, como que esperando algo acontecer. De repente, suas lágrimas começaram a cair de seus olhos imóveis. O eclipse lunar tinha começado. 
O Prefeito da cidade mandou apagar as luzes para aumentar a grandiosidade do momento. O Padre rezava um terço, o pastor um Salmo, a Mãe de Santo um ponto, o Judeu a Tora e Seu Elias, o Alcorão. Todos atentos olhando para cima, todos eufóricos com o acontecimento. Aos poucos a lua foi sumindo, sumindo, até que sumiu de vez. Depois de um silêncio profundo, que durou alguns minutos, uma voz gritou: _Ela está voltando! A lua estava voltando a aparecer devagarzinho. Aos poucos a luz da lua voltava a iluminar a praça. Quando estava bem cheia no céu, o Prefeito mandou acender a luz da cidade. 
Para surpresa de todos, onde estava a Dona Bianca, só estava seu vestido de chita e as sandálias de couro cru. Dona Bianca tinha sumido. No chão, junto do que sobrou de Dona Bianca, pequenas gotinhas brilhavam com o reflexo da lua. Eram as lágrimas de Dona Bianca. As gotinhas cresceram, juntaram-se umas nas outras e viraram uma pocinha de água. 
O Padre fez o Sinal da Cruz, o Pastor rezou um Salmo, a Mãe de Santo acendeu uma vela, o Judeu leu a Tora balançando seu corpo e Seu Elias pegou seu lenço e enxugou as lágrimas de Dona Bianca. Até hoje Seu Elias guarda, na última prateleira da venda, um vidro com as lágrimas de Dona Bianca. Quando a lua cresce, o vidro fica cheio. Quando a lua está nova, o vidro fica quase vazio. 
Desde então, Dona Bianca nunca mais apareceu. Uns dizem que a lua a levou para morar com ela. Outros dizem que ela fugiu da cidade quando todos estavam olhando para o céu. Já Seu Elias, sábio do Oriente, guarda o segredo de Dona Bianca no alto da prateleira.

Crédito da Imagem -  Moon Tears - Phoenixart

2 comentários:

  1. Obrigado Sónia! Bom ter sempre uma palavra de força e apoio para esta tarefa difícil que é criar e colocar nas tintas, idéias, sonhos e fantasias quetodos temos em nossas almas.

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  2. Ora essa! Obrigado eu pelo artigo. Muita força e tudo de bom.
    Aquele abraço.
    Sónia Marques

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