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sexta-feira, 19 de julho de 2013

Uma mão cheia de nada

Hoje fui ao shopping comprar gomas. Quem tem filhos sabe bem do que falo. A corrente que se gerou de seguida foi quase mágica e deixou-me a pensar. Depois de pedir e escolher as ditas gomas, a senhora da lojinha disse que não tinha troco. Como pretendia meter o euromilhões, rumei à papelaria em frente, com intenção de trocar dinheiro. Esperei na fila, coisa normal numa sexta feira, com a cabeça nas nuvens como todos aqueles que imaginam o que fariam com o prémio tão cobiçado. Quando chegou a minha vez de ser atendida, devia estar na fase em que me apercebo de que tudo não passa de um sonho partilhado com todos os que tentam a sua sorte e quase impossível de se tornar real. O senhor da papelaria disse uma frase que mudou o rumo desta história:
- "Então hoje que vai receber um prémio de milhões, está com essa cara tão triste?"
- Promete? Promete-me que este boletim é o premiado?
- "Claro que é!" - Respondeu o homem com um sorriso rasgado.
Saí da papelaria com um sorriso de esperança e divertida com o comentário. Contei o sucedido à senhora das gomas que me pediu o que todos pedem:
- "Olhe, se sair, não se esqueça de mim. Compra-me a loja e pode ser que eu finalmente possa fazer o que sempre quis."
Curiosa, perguntei-lhe qual o seu sonho. Contou-me que foi cabeleireira durante alguns anos e que o sonho passava por ter o seu próprio salão. O facto de ter trabalhado sempre para outros levou-a ser explorada e a vida fez o resto. Saiu da sua profissão para ajudar o marido numa empresa de artes gráficas, de que era proprietário. Perguntei-lhe se nunca pensou em receber clientes em casa ou num espaço seu, dando continuidade ao sonho e fazendo o que realmente gostava. Respondeu que tentou durante algum tempo, recebendo as clientes em sua casa. Tudo mudou no dia em que o marido impediu que aquilo continuasse. Dava-lhe mais jeito que a esposa se mantivesse a seu lado, trabalhando na gráfica. Prometeu que lhe daria um ano de trabalho para organizar as contas e que depois seria a sua vez de montar o tão sonhado salão. Passaram seis anos e a vontade e oportunidade de seguir o sonho, morreu com ele. Hoje, trabalha numa loja de gomas, de um centro comercial de bairro. A firma do marido há muito que faliu e o sonho era feito de álcool e evaporou. No rosto daquela mulher apenas reside a tristeza de nunca ter dado um murro na mesa e um encontrão na vida. Nos olhos dela, a amargura de quem seguiu o pensar do outro, desperdiçando a vida que poderia ter tido. O erro não foi dele. O erro não foi da crise. O erro não foi da vida. O erro foi tão somente dela que se acomodou ao que os outros escolheram para si. Pode até desculpar-se com a triste frase de que "os tempos eram outros". Mas não se pode esconder atrás de desculpas para se esquivar da verdade: a culpa foi somente dela. Ninguém é de ninguém. Ninguém tem o poder de viver por nós, a menos que lhes entreguemos esse poder. Fiquei a pensar em quantas "senhoras das gomas" existem por esse mundo fora. Deixei a promessa de voltarmos a falar do seu sonho assim que me saísse o euromilhões. No final, ainda lhe perguntei:
- Nunca viveu o seu sonho e o que é que ganhou?
- "Uma mão cheia de nada." - Respondeu.

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